Antes de pensarmos o texto de
Heidegger relacionando-o com a arte, devemos levar em conta a própria ressalva
feita pelo autor. Ele propõe que abramos nossa existência Dasein a essência da técnica. O pensamento de Heidegger sempre
aponta para suas investigações relativas à ontologia do Ser. Ao meu modo de ver, devemos estar dispostos a analisar a
questão como um processo, assim como o próprio Dasein - modo de Ser - que
se faz sendo. Levando em conta
sempre, que Heidegger, possui a concepção de que todo o pensar passa pela linguagem,
inclusive a arte. Todos os entes tem seu modo de ser, em que o
homem é um ente especial, pois é dotado da capacidade de questionar o Ser, sendo o tempo o horizonte
transcendental desta questão.
Ao encarar a tarefa como um
processo, devemos nos perguntar sobre qual arte está sendo falada. As artes
pré-industriais, assim como a tecnologia, conviviam em harmonia com a natureza,
ou pelo menos com um universo que poderia ser descrito como natural. De alguma
forma as explicações remontam as doutrinas de Aristóteles com as quatro causas – causa materialis, causa formalis, causa
finalis e causa efficiens.
Já a modernidade é a aplicação
racional da ciência moderna sobre a natureza, diferindo das explicações gregas.
A ciência moderna vê nos números o artifício para descrever o mundo, que só
existem quando lhes são atribuídas medidas. Tal noção faz parte do impulso de categorizar
todas as coisas, transcrevendo-as em equações matemáticas, leis físicas,
modelos de representação, etc. É o conceito de bestand de Heidegger, da visão
da tecnologia como um meio para a exploração e arquivamento da energia. O surgimento
de tal técnica é o que historicamente é definido por Heidegger como o fim da metafísica.
Estas proposições revelam um
Heidegger de viés marxista, assemelhando-se a questões debatidas por Walter
Benjamin, por exemplo, ao propor a questão da perda de experiência. Benjamin
ligava o mundo pré-industrial à oralidade, sendo que o artesão fabricava peças
únicas, contrário ao processo industrial, que cria objetos em série, sem a
marca de unicidade.
É ai que dialogamos com o
conceito de Ge-stell, dizendo que a
tecnologia não é um simples resultado de escolhas humanas, mas sim um autômato
relativo ao humano. O conceito engloba, portanto, o conjunto de todos os modos
que se impõem ao ser humano que existe hoje. Para Heidegger a essência
tecnológica é anterior a própria modernidade e seus artefatos, sendo essa a
pura aplicação do "emolduramento" (em inglês – “enframing”- e em alemão - das
Ge-stell). Neste sentido, das
Ge-stell, representa o modo de desolcultamento da tecnologia moderna. Ao
mesmo tempo este modo, coloca em xeque as formas de desolcultamento anteriores
e ao que parece o próprio desolcultar. Isto caracteriza a crise ontológica da
existência do Ser, que na concepção
heideggeriana é o portador da verdade.
Seria a arte então uma saída para
este processo?A partir destas considerações, penso que devemos propor uma
questão mais ampla: será que toda arte é capaz de romper com este processo?
Nesta medida, percebemos que há produções que se enquadram dentro deste mesmo processo
de “emolduramento”, sendo estas meras
aplicações alienadas ao processo. Desta forma podemos incluir o processo
crítico frankfurtiano, sobretudo em Adorno e Horkeimer, e suas idéias sobre o esclarecimento, que mais tarde culminaria
na crítica a Indústria Cultural. Talvez seja necessário uma experiência de choque para que transpareça um pensar para fora desta moldura.
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