quarta-feira, 22 de outubro de 2014

Produção e política

Em sua crítica, Benjamin discute o papel fundamental dos escritores no combate ao fascismo. O autor, em termos conceituais, estabelece uma diferenciação entre o que seria um escritor burguês e um progressista, sendo este aquele que decide a favor da causa proletária, que se coloca no campo da luta de classes e que tensiona a estrutura dos meios de produção. Trata-se do “autor como produtor”, solidário não apenas com o proletário, mas também com outros possíveis produtores.

Com essa lógica, Benjamin parece realçar um argumento em prol de uma revolução, que, no tocante aos meios de produção, seria uma certa desespecialização dos próprios meios, o que significaria uma abertura do processo produtivo para além dos credenciados, adotando uma lógica de uso legítimo onde todos podem, por princípio, produzir.

Essa última ideia ganha força hoje se pensarmos no potencial aberto pelas tecnologias contemporâneas. Elas apregoam que todos podem – desde que tenha interesse e acesso – tornar-se também produtor. O digital e a lógica de rede facilitou o manejo a favor da produção de conteúdos diversos, ampliou as negociações e interações – do contato para as conexões – e eliminou certos entraves espaço-temporais. Tudo isso, num primeiro momento, indica que, em termos políticos, há uma possibilidade maior de participação das pessoas na luta das causas que lhes interessarem.

Para ilustrar essa situação, basta ver os acontecimentos de junho de 2013. A partir de organizações que começaram nas redes sociais, estourou a nível nacional um movimento (ou movimentos) contestatório(s). Sua ação ultrapassou, por exemplo, a mídia convencional (que tornou-se, inclusive, alvo a ser contestado) e revelou uma insatisfação tão pontual (motivadas por diversas questões) como geral (tocou todo o país).

No entanto, se pensado em termos do potencial hoje ofertado, talvez a participação não seja tão aguda se proporcionalmente comparada com ativismos do séc. XX, por exemplo. Mas talvez seja inútil tal mensuração. Talvez seja apenas diferente. Ou talvez o que as relações atuais entre meio e produção tenha denotado aponte-nos uma outra questão.

Parece-me que ao abrir tais preceitos, os meios contemporâneos revelaram metaforicamente potenciais possibilidades da palavra “poder”, como nos apresenta MD Magno, ao falar sobre a passagem de um “poder” substantivo (que me parece bem mais relacionado à época de Benjamin) para um “poder” verbo. Agora as pessoas estão percebendo que podem, que também tem o poder. Com isso, fica-nos a prerrogativa de questionar se não seria o próprio modelo político (poder substantivo) hoje o cerne de uma causa cada vez mais perdida. As próprias bandeiras do movimento de junho alertaram: isso não me representa mais.

Porém, na falta talvez de uma proposta outra ou na própria invisibilidade desse “poder” verbo, os produtores ainda apresentam-se modestos. A causa ainda tocou a poucos. Ou não interessam a muitos. Breve saberemos.

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