segunda-feira, 8 de dezembro de 2014

Caiu na rede é peixe

A observação do pensador marxista Walter Benjamin sobre o autor (e produtor de informações) estaria voltada para uma divisão de interesses e autonomia, considerando as diferenças do escritor burguês e escritor progressista. A liberdade de escrever o que quiser estaria delimitada de acordo com a função e o nicho do autor. Referenciando Tretiakov, Benjamin compara dois tipos de escritores, o operativo e o informativo: enquanto a função do segundo é apenas informar, “a missão do primeiro é não relatar, mas combater, não ser espectador, mas participante ativo”. Mergulhamos aqui em duas grandes dicotomias de teorias do jornalismo, a do espelho e a construcionista que trazem dois olhares distintos sobre produzir jornalismo. Por um lado, o jornalismo deve ser imparcial e relator fiel da realidade, sem dispor de opiniões, como se fosse um espelho a refletir exatamente o que acontece ali, enquanto o construcionista deve atuar ativamente na construção de uma sociedade melhor de forma a delimitar não apenas uma opinião, mas também nortear uma série de reflexões que possam fazer o mundo um lugar melhor.

O que temos agora é uma pluralização gigante de “jornalistas” construcionistas, que produzem conteúdo, promovem vínculos de identificação nos meios alternativos, porque muitas vezes vários grupos de minorias não são retratados como queriam na grande mídia. Sem entrar na grande questão filosófica se o que o conteúdo informativo produzido livremente pelas milhares de câmeras de celulares nas ruas, a fim de identificar um acontecimento social ou um acidente é ou não é jornalismo, o que temos aqui são produtores construcionistas de conteúdos que agem muitas vezes de forma operativa (parafraseando Benjamin) na sociedade. Isso só é possível porque vivemos em uma Cultura da Participação, onde todos são não só emissores de informação, mas também produtores de conteúdo, seja ele ficcional ou não. Dentro dessa Cultura da Participação, que é abarcada pela Cultura de Convergência, onde é possível filmar com o celular e postar logo na rede, ficamos sabendo quase que instantaneamente de incêndios, vemos vídeos produzidos pela galera da comunidade sem corte e delimitação de estereótipos e temos acesso a materiais ficcionais narrativos produzidos por fãs, que são muitas vezes até melhores do que as propostas originais.   

Sob o ponto de vista político, os meios digitais também estão transformando os espectadores em participantes. Isso pode ser observado nas manifestações de julho de 2013 e também em diversas outras questões do dia-a-dia. Em relação às manifestações, graças às mídias alternativas e produção de conteúdo independente dos próprios participantes vieram à tona novos olhares sobre a realidade das manifestações, que a princípio a grande mídia não dava total cobertura por questões políticas e pela amplitude do evento, onde seria impossível captar tudo que acontecia no meio da multidão.  Um bom exemplo é a atuação da Mídia Ninja nas manifestações, que norteava através da cultura da participação um enfoque e enquadramento diferente do convencional proporcionado pela grande mídia. Não só a Mídia Ninja, mas também produções de conteúdos independentes de qualquer pessoa que estivesse com o celular e observasse algo potencial de ser colocado na rede era postado na internet e se tornava conteúdo informativo. Outros exemplos rotineiros de como os espectadores também tornam participantes nos meios digitais é que qualquer postagem pode auxiliar demais receptores e atuar de forma a produzir uma crítica e buscar uma solução para um problema ao mesmo tempo: informes sobre problemas relativos ao trânsito, enchentes, buracos nas ruas, problemas no serviço público de saúde, corrupção, problemas relativos a segurança. Embora esse espaço-rede propicie um mundo de noticias falsas, fofocas ou verborragias desnecessária, é melhor ter uma rede livre do que algum tipo de controle sobre ela. No mundo Big Brother, o que cai na rede é peixe e muitas vezes esse peixe é saudável e não possui espinhos. Eles não só nadam em um mar de informações, mas purificam e reproduzem conteúdo em um oceano onde ocorrem poucas diferenciações de espécie: onde estamos todos juntos e misturados.


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